A Idolatria da Juventude em TI: Quando o País Confunde Velocidade com Sabedoria
- Existe um preconceito recorrente em TI que associa juventude a competência automática e experiência a obsolescência.
- Dominar ferramentas é diferente de dominar consequências, riscos e arquitectura de sistemas.
- Projectos robustos exigem memória técnica, visão estratégica e cicatrizes reais de produção.
- O melhor ecossistema tecnológico é intergeracional, combinando ousadia com prudência.
- A preferência por perfis muito jovens pode esconder motivos económicos e culturais mais do que motivos técnicos.
A Idolatria da Juventude em TI
Diz-se, com a serenidade de quem não mediu a profundidade do mar, que os mais jovens em TI “mexem melhor” nas tecnologias. E diz-se isto como se a competência fosse um músculo de dedos e não um território de juízo.
A frase parece inocente, mas é uma pequena fábrica de equívocos.
Porque o que está em jogo não é apenas quem navega mais depressa num ecossistema de ferramentas.
É quem pensa, planeia e protege o futuro do sistema quando o brilho da moda se apaga.
O erro de confundir ferramenta com competência
Aprender uma linguagem nova, uma framework ou uma plataforma pode levar meses. Às vezes semanas.
Mas construir a capacidade de arquitectar, prever falhas, medir risco,
defender qualidade e negociar compromissos técnicos com o mundo real exige tempo — e não um tempo burocrático, mas um tempo de contacto directo com a realidade.
A experiência não é uma versão antiga do conhecimento.
É a camada invisível que impede o edifício de ruir quando o vento muda.
As cicatrizes que não vêm nos currículos
Há coisas que não se simulam: o silêncio de um sistema crítico às três da manhã, a migração que parecia simples e foi um campo minado,
a aposta numa solução “da moda” que envelheceu em doze meses, a arquitectura feita para impressionar que falhou quando o negócio cresceu.
Essas experiências são duras, não por serem românticas, mas por serem reais.
E é a realidade, mais do que o entusiasmo, que fabrica competência profunda.
O subtexto económico que ninguém admite
Às vezes, a preferência por juventude não é técnica.
É contabilidade.
Salários mais baixos, menos resistência a horários absurdos, maior tolerância à cultura da urgência permanente.
E assim nasce um teatro curioso: vende-se a ideia de modernidade enquanto se compra silêncio barato.
O futuro não é uma guerra de idades
O melhor cenário não é escolher entre gerações,
como quem escolhe entre sistemas operativos rivais.
É construir equipas onde: os mais novos tragam velocidade, ousadia e frescura, e os mais experientes tragam mapa, profundidade e serenidade estratégica.
Quando essa ponte existe, a inovação deixa de ser fogo-de-artifício e passa a ser engenharia com raízes.
Epílogo: a maturidade como tecnologia invisível
Um país que desvaloriza a experiência em TI
não está a apostar no futuro.
Está a amputar a memória.
Porque dominar tecnologia não é só saber “mexer”.
É saber o que acontece depois.
E esse “depois” é um território que só se conquista com décadas de vida no coração do mundo tecnológico.
A juventude é electricidade.
A experiência é rede.
Sem rede, a electricidade vira incêndio.
Fragmentos do Caos — Onde a experiência não pede desculpa por existir.


