A Austrália Quer Banir Menores das Redes Sociais — Mas Quem Vigia o Vigia?
BOX DE FACTOS
- A Austrália propõe proibir menores de 16 anos de aceder a redes sociais.
- Para cumprir a lei, as plataformas terão de verificar a idade real dos utilizadores.
- Os métodos propostos incluem biometria, análise facial, documentos de identidade e intermediários digitais.
- Especialistas alertam que estas soluções criam riscos sérios de vigilância massiva.
- A medida poderá ser tecnicamente ineficaz: adolescentes facilmente contornam estes sistemas.
A Austrália Quer Banir Menores das Redes Sociais — Mas Quem Vigia o Vigia?
O governo australiano quer impedir menores de 16 anos de entrar nas redes sociais. A intenção é nobre.
Mas o preço para cumprir a lei é terrível: a criação de uma máquina de vigilância digital como o mundo nunca viu.
Quando a Protecção se Torna Vigilância
A decisão da Austrália soa bem nos títulos dos jornais: proteger crianças, travar os predadores digitais,
impedir que adolescentes vivam em mundos que não conseguem compreender.
Mas para transformar essa moralidade em tecnologia, o Estado precisa de algo monstruoso: verificar a idade real de cada utilizador, em cada acesso, em todas as plataformas.
E aqui começa o pesadelo.
A Internet não foi construída para saber quem as pessoas são.
Foi construída apenas para transmitir informação.
Transformá-la numa máquina de identificação obrigatória é amputar a sua natureza.
O Arsenal Tecnológico: Biometria, Documentos e IA
Para cumprir a lei, as plataformas terão de adoptar um ou vários destes métodos:
- Verificação documental com cartão de identidade ou passaporte.
- Reconhecimento facial para estimar idade a partir de selfies.
- Análise biométrica comparada com bases de dados governamentais.
- Entidades verificadoras que certificam a idade e enviam apenas um sinal “maior/menor”.
Cada uma destas soluções tem um custo terrível: criamos a maior base de dados de crianças da história digital do planeta.
E entregamo-la nas mãos de governos, empresas e algoritmos.
O Paradoxo: Os Adultos São Vigiados Para “Proteger” os Jovens
Para impedir que um jovem de 15 anos abra uma conta no Instagram, um adulto de 45 terá de provar, diariamente,
que é quem diz ser.
E assim, por causa das crianças, vigia-se toda a população.
É o preço não declarado desta lei:
para proteger os menores, remove-se a privacidade dos maiores.
O Riso dos Adolescentes: VPN, Contas Falsas, Identidades “Emprestadas”
A ironia maior?
O alvo desta mega-operação digital — os adolescentes — estará sempre um passo à frente.
Em 48 horas terão soluções:
- VPNs que fazem parecer que vêm de outro país;
- Contas criadas com dados de familiares;
- Apps paralelas sem controlo;
- Sistemas de acesso clandestinos partilhados entre amigos.
O Estado constrói um muro de aço.
As crianças passam por baixo dele com um clip de papel.
Estamos a Construir um Estado Digital-Tutor?
O que verdadeiramente está em causa não é a idade, mas o precedente:
Se hoje verificamos identidades para proteger crianças, amanhã verificamos para proteger o Estado.
E assim nasce, silenciosamente, um Estado Digital-Tutor, aquele que decide quem entra, quem fala, quem vê e quem existe online.
A Alternativa Que Ninguém Quer: Educação, Responsabilidade e Ética
A verdadeira solução seria outra: mais lenta, menos vistosa e politicamente menos sexy.
- Educação digital séria, não “folhetos para pais”.
- Responsabilidade parental real, não delegada no Estado.
- Plataformas sem algoritmos viciantes.
- Redes sociais obrigadas a não explorar fragilidades cognitivas dos jovens.
Mas isto implica enfrentar as Big Tech.
E os governos modernos preferem legislar contra os adolescentes do que contra os gigantes tecnológicos.
Epílogo: O Futuro Não Será Infantil
A proibição australiana é apenas o primeiro acto de uma peça que se repetirá pelo mundo inteiro.
A questão já não é se os menores devem estar nas redes.
A questão é esta:
Quantos direitos estamos dispostos a perder para “proteger” quem mais facilmente ignora a protecção?
O futuro digital não será infantil — será profundamente adulto, sério e perigoso.
E talvez, quando olharmos para trás, percebamos que a ameaça real nunca foram as redes sociais…
mas o sistema que construímos para “as controlar”.
Série Contra o Teatro da Mediocridade Digital.


