O Novo Culto Corporativo: Juventude, Vaidade e a Morte da Experiência

💡 As Startups do Vazio: Quando a Juventude Substitui o Conhecimento
Por Francisco Gonçalves
· SofteLabs / Fragmentos do Caos
Vivemos uma época curiosa: nas empresas — e sobretudo nas de tecnologias de informação —, a juventude é a nova competência.
Não se contratam cérebros, contratam-se caras.
Não se avaliam ideias, mas idades.
O valor profissional mede-se em rugas — e quanto menos, melhor.
As empresas não querem conhecimento, querem juventude.
Querem velocidade sem direção, confiança sem sabedoria, código sem consciência.
1️⃣ O culto da aparência técnica
Hoje, nas entrevistas de emprego, fala-se mais de “energia”, “fit” e “espírito jovem” do que de lógica, arquitetura ou segurança.
A superficialidade ganhou estatuto de valor estratégico.
O programador sénior é visto como anacrónico; o gestor de 50 anos é tratado como relíquia; o engenheiro experiente é “caro e ultrapassado”.
Ironia das ironias: estas mesmas empresas que desprezam a maturidade, juram “aprender com os erros”.
Mas quem aprendeu, é precisamente quem já não é bem-vindo.
O novo profissional ideal é jovem, bonito e sabe decorar buzzwords em inglês.
O velho profissional ideal é… invisível.
2️⃣ A infantilização das chefias
Assistimos à ascensão meteórica de “coordenadores” de vinte e poucos anos.
Gente que lidera equipas sem nunca ter falhado o suficiente para entender o que é liderar.
São os Peter Pans corporativos: eternamente jovens, eternamente imaturos, convencidos de que cinco anos em TI bastam para governar um império.
O princípio de Peter é agora uma cultura.
Sobe-se depressa demais, aprende-se de menos, e lidera-se sem noção.
As empresas tornaram-se laboratórios da incompetência entusiástica — e, como sempre, confundem entusiasmo com competência.
3️⃣ O colapso do mérito
As equipas tecnológicas parecem modernas, mas são frágeis.
São tribos de ego, não comunidades de saber.
O respeito desapareceu: quem tem experiência é visto como ameaça, quem questiona é rotulado de “difícil”.
O resultado é previsível — uma sociedade do erro normalizado, onde se repete a mesma falha com um sorriso “inovador”.
A mediocridade aprendeu a usar hoodie e a falar em sprints.
4️⃣ A ilusão das “melhores práticas”
Todos seguem “as melhores práticas”.
Ninguém pensa por si.
O Excel, o Jira e o PowerPoint substituíram o raciocínio.
O engenheiro deixou de ser criador e tornou-se executor de templates.
E o país, à imagem das suas empresas, produz líderes de superfície — e projetos sem profundidade.
O drama é que acreditam, sinceramente, que estão a fazer tudo certo.
O sistema é tão bem formatado que já não sabe o que é pensamento crítico.
5️⃣ Conclusão: a geração do ruído
Vivemos a era da juventude permanente, do entusiasmo sem memória.
O futuro pertence aos que ainda acreditam que sabem — até perceberem que apenas repetem.
E enquanto o país expulsa os sábios, promove os ingénuos e idolatra os “influencers” de código, a competência emudece.
A sabedoria não envelhece — apenas é despedida por não ter o filtro certo no LinkedIn.
Francisco Gonçalves
SofteLabs / Fragmentos do Caos · Outubro 2025


