
Estado : Empregos vitalícios e privilégios
Contra o Teatro da Mediocridade: O Tempo como Carreira
Na função pública portuguesa, a progressão na carreira continua a ser ditada quase exclusivamente pela antiguidade.
Em Portugal, há um território onde o tempo não é apenas uma medida da vida, mas a moeda de troca de toda uma carreira.
Não é o mérito que abre portas, não é a ousadia que ergue degraus, não é a competência que acelera ritmos.
É a simples cronologia: a cada ano, um passo; a cada década, uma cadeira mais pesada; e, por fim,
a certeza tranquila de uma reforma a salvo das intempéries.
Este modelo, resquício endurecido do Estado Novo, permanece intocável na função pública. Enquanto o país mudou de regime,
de Constituição e até de século, esta lógica de “estar é vencer” resistiu como fósforo que arde devagar, mas nunca se apaga.
O “emprego para a vida” tornou-se o último reduto de estabilidade — e também de imobilismo.
Não se trata de invejar, mas de reconhecer a injustiça estrutural: uma geração inteira entra na máquina do Estado já derrotada
pela espera, sabendo que o talento será sempre secundário ao calendário. É o triunfo da paciência sobre a excelência,
da longevidade sobre a inovação.
Enquanto isso, na rua, no setor privado, a precariedade é rainha. E neste contraste feroz se instala o teatro da mediocridade nacional:
uns suspensos na eternidade dos privilégios, outros a correr no labirinto da incerteza.
Portugal continua assim a pagar tributo a um tempo que já devia ter acabado.
Mas, ironicamente, o relógio nunca parou de marcar presença — só que marca sempre para os mesmos.
Publicado em Fragmentos do Caos — Série Contra o Teatro da Mediocridade

