
O Eterno Provincianismo Luso
A Síndrome do Império de Quintal: A Euforia Pueril do Provincianismo Lusitano
Como a celebração do mínimo denominador comum nos impede de crescer
É um espetáculo peculiar, repetido ad nauseam nas televisões, nos cafés e nas redes sociais: a euforia desproporcionada com uma conquista menor. Um prémio internacional qualquer, uma referência fugaz num jornal estrangeiro, a inauguração de mais um data center ou a eleição de uma praia portuguesa num ranking duvidoso. Aclama-se com o fervor de quem descobriu o caminho marítimo para a Índia.
Esta “alegria de província” – este provincianismo puto – não é inofensiva. É o sintoma de uma adolescência cultural prolongada, um complexo de inferioridade mascarado de triunfalismo que nos condena à mediocridade.
1. A Festa da Cabanização Global
Vivemos na era da globalização, mas a mentalidade permanece cabana. O mundo aplaude um chef português? “Finalmente, o mundo reconhece-nos!”
O problema não é o reconhecimento, mas a necessidade patológica dele. Uma nação madura não precisa da validação externa constante para afirmar o seu valor. Esta atitude revela uma profunda insegurança: somos a menina dos olhos do pai Europa, ansiosos por um elogio.
Celebramos a chegada dos “doutores” estrangeiros (os investidores) como outrora se celebrava a visita do rei à vila. É uma visão folclórica e subalterna do nosso lugar no mundo.
2. O Elogio do Acessório e o Esquecido do Estrutural
Enquanto nos distraímos com os holofotes dos data centers e dos rankings de felicidade, os pilares do país definham.
A euforia com o macroeconómico esconde o drama do microeconómico: os salários de miséria, a hemorragia de cérebros, a crise habitacional.
É mais fácil falar, com ar de especialista, da estratégia nacional para o hidrogénio verde do que encarar a realidade de que um jovem licenciado não consegue alugar um apartamento em Lisboa.
Este provincianismo é, portanto, uma forma de escapismo nacional. Falamos do futuro high-tech para não termos de resolver os problemas low-tech do presente.
3. O Complexo de Vira-Lata Revestido a Ouro
O sociólogo brasileiro Sérgio Buarque de Holanda cunhou o termo “homem cordial”. Portugal sofre do “país cordial”.
Preferimos a relação superficial, o elogio fácil, à crítica construtiva que efetivamente constrói.
Este provincianismo é a versão moderna do “orgulhosamente sós”, mas agora somos “orgulhosamente integrados”.
No fundo, a lógica é a mesma: uma autoestima frágil que se alimenta de placebos. É o complexo de vira-lata que, em vez de superado, foi maquilhado com fundos europeus e discursos de inovação. Por baixo do verniz moderno, a ossatura continua fraca.
Conclusão: A Maioridade que nos Assusta
O provincianismo puto é o conforto da pequenez. É a recusa em crescer, em assumir a complexidade e as contradições de um país adulto.
Um país adulto não vive de efemérides e de likes internacionais; confronta os seus problemas com pragmatismo e ambição verdadeira.
A pergunta que fica é: quando é que trocamos a euforia do elogio pela satisfação da competência?
Quando é que deixamos de ser a província que se alegra com a visita do rei e passamos a ser nós próprios a ditar o nosso destino?
A resposta, receio, ainda não está no script desta comédia de costumes em que insistimos em representar.
Artigo autoria de ✒️Francisco Gonçalves
📖💫 Fragmentos do Caos

