
Portugal e o Véu: a Linha de Luz entre a Tolerância e o Perigo
Choque Civilizacional e o Véu da Liberdade
A liberdade, o véu e o rosto de uma nação
A burka, símbolo máximo de ocultação, cobre o corpo e o rosto da mulher muçulmana. O niqab deixa apenas os olhos visíveis.
Em Portugal, não há lei que proíba o seu uso em espaço público — mas a questão acende o debate entre liberdade individual e segurança colectiva.
Vivemos uma época em que o confronto entre civilizações deixou de ser teórico para se tornar palpável nas ruas, nas escolas e nos parlamentos da Europa.
O véu, que em certas tradições é símbolo de devoção, tornou-se também estandarte de uma ideologia que vê a mulher não como ser livre, mas como sombra de um homem.
E Portugal, país de mar aberto e alma universalista, começa agora a sentir o peso dessa contradição.
A fronteira invisível das civilizações
O politólogo Samuel Huntington previu este embate há mais de três décadas: o mundo não seria dividido por ideologias, mas por culturas — e cada cultura defenderia os seus valores como muralhas.
O Ocidente ergue-se sobre a liberdade individual, a igualdade de género e o pensamento racional; o Islão conservador sobre a submissão à lei divina, à hierarquia patriarcal e à obediência comunitária.
Quando estes mundos se cruzam, a fricção é inevitável.
Em Portugal, a convivência pacífica é possível — mas não é garantida.
A nossa hospitalidade, confundida com ingenuidade, abre as portas sem perceber que algumas ideias não entram para conviver, entram para transformar.
E o que começa como um gesto de tolerância pode, com o tempo, tornar-se um cavalo de Troia cultural.
O rosto e a identidade
O rosto é a expressão da alma. É nele que habita a linguagem silenciosa da humanidade.
Uma sociedade que aceita que metade dos seus membros viva sem rosto está, pouco a pouco, a abdicar da sua própria identidade.
A burka não é apenas um pedaço de tecido — é um manifesto que diz: “eu não pertenço ao vosso mundo”.
E quando o Estado fecha os olhos, o símbolo transforma-se em fronteira.
Alguns dirão: “É liberdade religiosa.”
Mas a liberdade, quando se torna refém da opressão, deixa de ser liberdade.
Quantas dessas mulheres escolhem verdadeiramente o véu integral? Quantas o usam por imposição familiar, comunitária ou por medo da reprovação divina?
O problema é ético antes de ser político: como proteger a liberdade de quem foi ensinado a temê-la?
O perigo que se esconde no véu
Há também o lado sombrio — o que se esconde por trás da cortina da devoção.
A Europa já sentiu, em tragédias sangrentas, o que acontece quando o extremismo se infiltra sob o disfarce da fé.
Atentados em Paris, Londres, Bruxelas e Berlim nasceram de guetos onde o Estado se tornou invisível e onde a religião substituiu a cidadania.
E o véu, nesse contexto, torna-se não apenas um símbolo religioso, mas um manto de invisibilidade — literal e metafórico — que permite ocultar rostos, identidades, intenções.
Em nome da segurança nacional, alguns países europeus proibiram o uso da burka em espaços públicos.
A França, a Bélgica, a Dinamarca e os Países Baixos afirmaram que o espaço público deve ser de igualdade e transparência.
Portugal, porém, continua hesitante — receia ser acusado de intolerância.
Mas a verdadeira intolerância é permitir que o medo paralise a defesa da liberdade.
A falsa paz da neutralidade
Não se trata de odiar uma religião — trata-se de proteger uma civilização.
A Europa não pode continuar a ceder terreno em nome de um multiculturalismo que, em muitos casos, tem sido unidireccional: nós toleramos, eles impõem.
É preciso compreender que o terrorismo moderno não nasce apenas nas mesquitas — nasce nas ideias que normalizam a submissão, a segregação e a negação da mulher como ser pleno.
Permitir que uma cultura de clausura se instale dentro de uma civilização de abertura é um paradoxo mortal.
O terrorismo, antes de se tornar explosão, é semente — e a semente germina no solo fértil da complacência.
Portugal: entre a tradição humanista e o dever de proteger
Portugal tem uma longa tradição de encontro entre povos.
Fomos nação de navegadores, não de inquisidores.
Mas ser tolerante não é ser ingénuo.
Há fronteiras que a bondade não pode deixar cair, sob pena de a liberdade se afogar nas suas próprias lágrimas.
Um país que não protege a sua identidade cultural e civilizacional acabará por perder a sua voz no concerto das nações.
A defesa da segurança e dos valores fundamentais — a laicidade, a dignidade feminina, a igualdade perante a lei — não é racismo nem xenofobia: é lucidez.
Conclusão: o rosto da liberdade
O verdadeiro rosto de Portugal não usa véu.
É feito de luz, de mar, de coragem e de pensamento livre.
Proibir a burka não é proibir a fé — é defender a visibilidade humana, a segurança pública e o princípio essencial de que todos devem poder olhar o outro nos olhos.
Porque uma sociedade onde os rostos se escondem é uma sociedade que começa a viver na sombra.
E a sombra é sempre o primeiro refúgio da servidão — e do terror.
© Francisco Gonçalves — Fragmentos do Caos

