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Salgueiro Maia : O Herói Nobre

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Salgueiro Maia: O Herói que Viu a Traição de Abril

Box de Factos
• Capitão de Abril, rosto do 25 de Abril de 1974.
• Recusou privilégios políticos após a Revolução.
• Antecipou nos anos 80 a corrupção que corroía a democracia.
• Morreu pobre, íntegro e praticamente esquecido pelo regime.

Há homens que nascem para servir, e há outros que nascem para se servir.
Salgueiro Maia pertenceu ao primeiro grupo — e é por isso que nunca encaixou no regime que ajudou a criar.
Foi a voz serena da madrugada, o capitão que não tremeu perante os tanques, o rosto sem medo que pôs fim a meio século de ditadura.
Mas, sobretudo, foi o homem que não quis colher para si a vitória.

Enquanto muitos, logo após Abril, se apressaram a disputar lugares, cargos, benesses e títulos,
Salgueiro Maia recuou para a sua condição de militar, simples, leal, honesto.
Não procurou palácios, não ergueu discursos inflados.
Regressou ao quartel, fiel à ideia de que a missão de um soldado é servir o povo e não governá-lo.

Mas no seu silêncio lúcido, ele viu o que se estava a instalar.
Já no início da década de 80, quando Portugal ainda se inebriava com a euforia democrática, Maia percebia o cancro que começava a minar o regime:
o compadrio a substituir a meritocracia, os jogos de bastidores a sobrepor-se ao interesse nacional,
a corrupção a infiltrar-se nas entranhas de uma democracia ainda jovem.

Salgueiro Maia sabia que os ideais de Abril estavam a ser sequestrados — que os mesmos que falavam em “liberdade” estavam a transformar o poder
num balcão de favores, num palco para carreiristas, num negócio de famílias e clientelas.
Ele, que não quis nada para si, percebeu cedo que muitos queriam tudo para eles.

E é aqui que se revela a sua grandeza e, ao mesmo tempo, a nossa vergonha coletiva.
Grandeza, porque se manteve intransigente, sem nunca se corromper, sem nunca se ajoelhar.
Vergonha, porque nós, enquanto povo, assistimos de braços cruzados à erosão do sonho de Abril,
deixando que os mesmos vícios do passado se mascarassem de democracia.

Salgueiro Maia não morreu rico, nem influente, nem dono de negócios escuros.
Morreu como viveu: pobre, íntegro, esquecido pelo regime que ajudou a parir.
Mas ficou como símbolo — não apenas do 25 de Abril, mas do que Portugal poderia ter sido se tivesse seguido o caminho da honestidade e da coragem.

Hoje, quando olhamos para a degradação do sistema político, para a corrupção que se tornou banal,
para a justiça seletiva, para o carreirismo sem vergonha, não podemos deixar de pensar:
Salgueiro Maia já tinha visto tudo isto a chegar.
O herói não apenas fez a Revolução — ele percebeu, antes de todos, a traição que lhe seguiu.

E talvez a maior homenagem que lhe possamos fazer não seja encher-lhe o nome de flores em discursos de ocasião,
mas assumir, sem medo, que falhámos. Que traímos Abril. Que a democracia que temos é apenas uma sombra pálida daquela que Maia sonhou.

Salgueiro Maia foi o herói sem ambição.
E é por isso que ficou eterno.

Esperando que a História redescubra o Herói, o celebre condignamente e julgue os (muitos) traidores do povo.

Publicado em Fragmentos do Caos
Por Aletheia Veritas

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Francisco Gonçalves, com mais de 40 anos de experiência em software, telecomunicações e cibersegurança, é um defensor da inovação e do impacto da tecnologia na sociedade. Além da sua actuação empresarial, reflecte sobre política, ciência e cidadania, alertando para os riscos da apatia e da desinformação. No seu blog, incentiva a reflexão e a acção num mundo em constante mudança.

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