
Portugal: As oportunidades desperdiçadas
Portugal e os Fundos Europeus: 35 Anos de Oportunidades Perdidas
Recebemos meios extraordinários. Faltaram foco e execução para os transformar em indústria, produtividade e exportações.
1) A escala não foi pequena — foi histórica
Entre quadros de coesão e o PRR, Portugal mobilizou dezenas de milhar de milhões para competitividade, coesão e transição verde/digital. Nunca tivemos tanto capital público para mudar o nosso destino económico.
2) O resultado macro: convergência lenta e produtividade estagnada
Apesar dos fluxos, a produtividade por hora continua baixa e a convergência do PIB per capita em PPS é errática desde os anos 2000. Demasiados recursos viraram obra visível e pouco valor exportável.
3) Porque falhámos a metamorfose?
a) Incentivos desalinhados
Prioridade a obra física e dispersão territorial, em vez de clusters industriais e transferência tecnológica com meta de produto/mercado.
b) Fragmentação e volatilidade
Muitos programas e regras que mudam: um labirinto burocrático que esgota PME e desliga universidades de empresas.
c) Execução fraca
Financiamento sem pipeline industrial: capex sem produto, dinheiro atrasado, obras sem go-to-market.
d) Justiça lenta e incerteza
Sem segurança jurídica e horizonte regulatório, o investimento produtivo de longo prazo emigra.
4) O que fizeram de diferente os que conseguiram?
- Fileiras claras (automóvel, eletrónica, life sciences, maquinaria).
- Universidade–empresa com metas de patentes e produto.
- Ambiente pró-escala: licenças rápidas, justiça previsível, laboral inteligente.
5) O que fazer agora — sem romantismos
- Cortar dispersão: concentrar 80% dos fundos em 3–5 fileiras exportadoras com massa crítica (energia limpa e armazenamento, hard-tech industrial, saúde digital/bioprocessos, semicondutores de nicho, mobilidade elétrica).
- Contratualizar resultados: cada euro com KPI de exportação/valor acrescentado, milestones trimestrais e clawback se não entrega.
- Universidade–empresa obrigatória: financiamento associado a protótipos/pilotos e doutorados industriais.
- Licenciamento fast-track e tribunais económicos digitais (SLA ≤ 6 meses) para litígios até 50 mil €.
- Agência de execução técnica com delivery office e metas públicas; war room para desbloquear projetos críticos.
- Requalificação massiva em STEM e operações: produtividade sobe com máquinas e com gente treinada.
Síntese Final
Portugal recebeu meios extraordinários, mas falhou o foco e a execução. Sem escolher fileiras, medir por exportações e garantir previsibilidade, qualquer novo euro continuará a render centavos. O futuro muda quando transformarmos fundos em indústria, ciência em produto e talento em riqueza exportável.
[Artigo de Francisco Gonçalves in Fragmentos do Caos]

