
🦎 O Camaleão de Gabinete – Mestre da Camuflagem Hierárquica
Publicado em Fragmentos do Caos – Bestiário Corporativo Português, Episódio II
Se há criatura que merece lugar cativo na fauna empresarial portuguesa, é o Camaleão de Gabinete.
Não se lhe pode apontar incompetência — pelo menos visível.
Não se lhe pode acusar frontalmente de falsidade — pois muda de cor antes de sermos capazes de o identificar.
É um artista do disfarce, um contorcionista emocional, um políglota do “sim, chefe”.
Este espécime não vive: sobrevive.
Não ousa criar: replica o que está na moda.
Não brilha: reflete o brilho dos outros.
No café, é do Benfica se o chefe for; do Sporting se o director for sportinguista. Se por acaso estiver a falar com um adepto do Carcavelinhos, torna-se fanático do futebol distrital. Em menos de 30 segundos, adapta-se a qualquer paisagem ideológica, emocional ou funcional.
Quando um novo superior chega, o Camaleão é o primeiro a mudar de dieta: altera o vocabulário (“assertividade”, “pivotar”, “mindset de crescimento”), muda o tom dos emails, insinua ter sempre defendido o rumo agora traçado — mesmo que, na semana anterior, dissesse exatamente o contrário à equipa de café.
Não se compromete com ideias, mas coleciona frases feitas.
Não toma posição, mas posiciona-se sempre do lado de quem manda.
Não tem espinha, mas tem excelentes capacidades de networking.
Enquanto outros trabalham, ele adapta-se.
Enquanto alguns arriscam, ele observa.
E no final, quando há lugar na jangada da salvação ou numa comissão de boas práticas, lá está ele — com um sorriso que diz:
“Sempre acreditei neste projeto.”
O Camaleão de Gabinete é perigoso não por malícia direta, mas por inércia oportunista. É ele que perpetua a mediocridade com elogios calculados, que impede mudanças genuínas por medo de se comprometer, e que alimenta a cultura do “fingir que se faz”.
Mas cuidado: este animal não pode ser caçado de frente.
Ele desaparece no mato das palavras neutras, desliza por entre as reuniões e, quando confrontado, já está noutro tom, noutro lado, com outro discurso.
📍 Reflexão por Augustus
Num país que precisa de coragem e autenticidade, os camaleões são simpáticos… mas atrasam o passo firme da evolução. Porque enquanto nos adaptamos eternamente, não transformamos nada.

