
A Cor da Pobreza: A Segregação Invisível do Portugal Moderno
Por Francisco Gonçalves
Fala-se muito em igualdade.
Fazem-se campanhas coloridas, cartazes com rostos diversos, discursos sobre tolerância e inclusão.
Mas há uma cor que não entra nesses slogans: a cor da pobreza.
Sim, a pobreza tem cor, e não é preta, branca ou cigana.
É a cor da humilhação.
É a cor do invisível.
É a cor do cimento molhado que cola aos pés dos que nascem sem património, sem influência, sem meios.
Vivemos num país que diz integrar, mas que segrega com a frieza do IBAN.
Portugal abre as portas aos imigrantes, pede braços para os campos, para os estaleiros, para os turnos mal pagos — mas depois vira-lhes as costas. Deixa-os viver em barracões sem água, em quartos alugados por 500 euros, em bairros onde o Estado só aparece para demolir, nunca para cuidar.
E não pensem que esta violência atinge só quem chega de fora.
Atinge também os filhos dos pobres cá dentro.
Atinge a dona Rosa da Amadora, o António da Covilhã, o João do Seixal.
Todos os que ganham o salário mínimo para pagar o máximo que o mercado pede.
A pobreza é a maior e mais cruel das segregações.
E é mantida de forma consciente por governos que governam para os proprietários, para os fundos de investimento, para os bancos, e não para o povo que os elege.
Estes mesmos governos que fingem espanto quando há barracas em Loures, mas que cortaram o investimento em habitação pública, congelaram salários, permitiram a especulação sem controlo, e a gentrificação que empurra os pobres para fora das cidades — e para fora da dignidade.
A pobreza é segregada em tudo:
– Na escola onde falta tudo,
– No hospital onde esperas horas,
– No bairro onde a polícia patrulha mais do que protege,
– No emprego onde se aceita tudo por medo de perder tudo.
O Estado não é neutro nisto.
O Estado é cúmplice ativo desta nova forma de apartheid social.
E os autarcas e governantes que aprovam despejos sem alternativas, que não constroem habitação, que legislam para o capital, são os executores modernos de uma exclusão legalizada.
Não basta apontar o dedo à pobreza.
É preciso apontar o dedo a quem a fabrica.
E exigir mais do que caridade e promessas:
exigir justiça, redistribuição, e uma nova ética pública.
Até lá, continuaremos a escrever, a denunciar, a incomodar.
Porque, como dizia Bertolt Brecht:
“Há homens que lutam um dia e são bons.
Há outros que lutam um ano e são melhores.
Mas há os que lutam toda a vida: esses são os imprescindíveis.”
E neste Portugal injusto, o pobre que resiste é herói.
E o sistema que o empurra para o chão, é um crime institucionalizado.

