
📺 Do Preto e Branco à Monocromia Mental: Crónica de um País Hipnotizado
Ligo a televisão.
Cinco, seis canais…
Tudo a cores, tudo a gritar, tudo a girar — e nada que valha uma ideia.
Vejo programas que se dizem “de entretenimento”, mas entretêm o vazio.
Penso: valia mais um canal a preto e branco em 1970.
Sim, um só, mas com mais cultura do que toda esta constelação de ruído em alta definição.
Nesse tempo, entre o chiar do ecrã e os fantasmas do transmissor de Monsanto, vinham até nós:
- Peças de teatro transmitidas para o povo,
- Conferências com gente que sabia do que falava,
- Programas de divulgação científica
- Música com alma, não com batida fabricada,
- Silêncios que diziam mais do que mil “talk shows” gritados.
Hoje, temos luzes LED, mas falta-nos iluminação.
Hoje, com meia dúzia de canais em alta definição, temos:
Concursos com perguntas que insultam a inteligência,
Telenovelas que repetem os clichés emocionais de há 40 anos,
Comentadores a fingir que pensam,
Debates com eminências pardas e jornalistas que mentem, e bem, a favor de quem melhor lhes paga, ou dos governos.
E reality shows onde se premeia quem mais berra ou mais se despe.
Temos milhões de pixéis, mas não vemos nada.
Temos vinte repetições da mesma novela, da mesma opinião, do mesmo escândalo cozinhado — mas nenhum convite a pensar.
Não admira que o mundo esteja como está:
Uma m… colorida, editada, patrocinada e amplamente divulgada.
A televisão, que podia ser janelinha de saber e cultura, virou espelho de um país que prefere não pensar.
A inteligência foi trocada por palminhas,
O pensamento por palhaços de horário nobre,
A reflexão por ruído com música de fundo.
É a era do “espetáculo do vazio” — como dizia Baudrillard, mas com patrocínio e intervalos publicitários.
A cultura foi trocada por “conteúdo”, a inteligência por “opinião”, e a educação por “influencers”.
O mundo não está uma m. por acaso — está uma m. com produção em direto, guião medíocre e transmissão paga com os nossos impostos.
Dizem-nos: “Mas isto é o que o povo quer!”
Mentira.
É o que deram ao povo até o povo pensar que é só isso que merece.
E para terminar e para minha desilusão pessoal, nunca imaginei na década de 80, que o progresso expectável do país iria desembocar nisto. Nesta m.
E que tal voltarmos atrás e fazer tudo de novo… mas bem e com progresso real de cidadania e democracia digna !?
✍️ Reflexão de Francisco Gonçalves
Cidadão atento, resistente à lavagem de consciência em 1080p.
“Valia mais um canal a preto e branco em 1970 — onde a cultura chegava sem gritar, e o pensamento se servia quente, sem efeitos especiais. Hoje temos seis canais a cores, todos em directo para o abismo. E o povo, hipnotizado, aplaude. Porque ensinaram-lhe que entretenimento é esquecer… e pensar é perigoso.”
Francisco Gonçalves, em tom satírico

