Democracia e Sociedade

Portugal Não Precisa de Mais Relatórios “Porter” — Precisa de Coragem e Acção


Por Francisco Gonçalves

Volta a falar-se na encomenda de um novo “relatório estratégico” ao estilo do famoso Relatório Porter de 2004. Depois de duas décadas de diagnósticos ignorados e promessas não cumpridas, a classe política volta a alimentar a ilusão de que um documento vindo do exterior poderá resolver os bloqueios profundos que o país enfrenta. A verdade é dura, mas precisa de ser dita: Portugal não precisa de mais diagnósticos. Precisa de coragem. Precisa de ação.

O Relatório Porter, encomendado há 20 anos, era uma proposta séria, com visão estratégica e recomendações sensatas sobre produtividade, clusters económicos, inovação e reformas do Estado. Mas foi engavetado. Morreu por falta de vontade política, pela resistência dos interesses instalados e pela ausência de um plano de execução. Nada foi feito. Ou melhor: fez-se aquilo que é habitual — uma operação de cosmética política.

Agora fala-se num Porter 2.0. O contexto é outro, mas os vícios são os mesmos. Temos um regime político atolado em escândalos, com uma elite partidária que há muito perdeu credibilidade e que insiste em fingir que o problema é a falta de estudos. Não é. Os problemas estão identificados há décadas: produtividade anémica, empresas de baixo valor acrescentado, fiscalidade asfixiante, educação desadequada ao século XXI, justiça ineficaz, Estado ineficiente, sociedade civil marginalizada.

O que falta? Faltam líderes com espinha dorsal. Faltam pactos interpartidários. Falta ética na governação. Falta respeito pelos cidadãos e pelo futuro do país.

Portugal precisa de uma Agenda 2035 com metas concretas, prazos, monitorização independente e envolvimento real dos cidadãos e das universidades. Precisa de deixar de fingir que vai reformar quando, na prática, apenas recauchuta narrativas para adiar o essencial: quebrar o ciclo de mediocridade.

Mais relatórios pagos a peso de ouro servirão apenas para mais uma década de frustração. Pior: banalizam o conceito de planeamento estratégico e desacreditam qualquer iniciativa séria que ainda possa surgir.

O país precisa de visão, sim — mas acima de tudo precisa de vontade. De ruptura. De ação. E isso, lamento dizê-lo, não vem nos relatórios.


Leia aqui uma Agenda 2035 com metas concretas, prazos, monitorização independente :

Francisco Gonçalves, com mais de 40 anos de experiência em software, telecomunicações e cibersegurança, é um defensor da inovação e do impacto da tecnologia na sociedade. Além da sua actuação empresarial, reflecte sobre política, ciência e cidadania, alertando para os riscos da apatia e da desinformação. No seu blog, incentiva a reflexão e a acção num mundo em constante mudança.

Deixe uma resposta

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *