
Evaristo, dá-me o teu chip – A Farsa da IA à Portuguesa
Há dias, Portugal tremeu de emoção. Não por causa de um terramoto, mas porque nasceu o “Evaristo” — o primeiro chatbot em português baseado em inteligência artificial aberta. Foi notícia, foi aplauso, foi orgulho nacional.
E eu, claro, fiquei comovido. Tão comovido como quando alguém me mostra uma cassete VHS dizendo que descobriu o streaming.
Sim, senhores: inventámos a roda. Aberta. Em português.
Aparentemente, ninguém avisou os nossos intrépidos engenheiros que a IA de código aberto existe… há anos. E que, pasmem-se, funciona! DeepSeek 2023, Mistral, LLaMA — todos eles capazes de conversar em português com mais fluência do que alguns políticos em campanha. Estão no GitHub, prontos a correr num simples Samsung S22. Mas vá, quem precisa disso quando temos o Evaristo?
Portugal tem esta veia única — a de anunciar como descoberta o que o mundo já ultrapassou em três gerações tecnológicas.
É um país onde se celebra o copy-paste como se fosse invenção, desde que venha com orçamento europeu e cobertura televisiva.
E o Evaristo encaixa como luva nesse folclore digital.
Recordo-me de quando, nos anos 80, José Tribolet, ícone da engenharia portuguesa, começou a aplicar o modelo “pensar à frente com o dinheiro dos outros”. Desde então, não evoluímos muito. Continuamos a fazer projetos para relatório, software para concurso, protótipos para fotografia. Nada para durar. Nada para servir.
Mas voltemos ao Evaristo. Dizem que é baseado em “IA aberta” — mas não dizem qual. Um modelo adaptado? Um fine-tune nacional? Um prompt colado ao GPT? Mistério.
O importante é parecer moderno, mostrar um ecrã com um boneco animado e chamar-lhe “revolução digital”.
Enquanto isso, os verdadeiros inovadores — os que já usam, testam, adaptam e integram modelos open-source reais — continuam a ser ignorados. Não há palco para quem trabalha. O palco é para quem inaugura.
A verdade é esta: Portugal continua a ser governado por pasmados tecnológicos. Pessoas que acham que a inovação é um PowerPoint bonito, que confundem conferências com transformação, que vivem debaixo de uma pedra com ligação ao PRR.
Evaristo é só o símbolo mais recente desse teatro.
Um teatro onde o país está sempre “a dar os primeiros passos” em tudo — mesmo que o mundo já esteja a correr maratonas.
É triste. É patético.
Mas acima de tudo, é português.
Artigo da autoria de Francisco Gonçalves & Augustus Veritas in Fragmentos de Caos
“Evaristo, tens cá disto?”
Perguntava o povo ao robô de olhos vazios, com voz programada em Python e sotaque de quem aprendeu português nos ficheiros do INE.
Mas Evaristo não tinha disto. Nem daquilo.
Tinha só PowerPoint, patrocínio estatal e um ar de quem ia mudar tudo — sem fazer nada.
.

