Democracia e Sociedade

O PCP, a Entrevista e o Velho Fantasma da Intolerância


A recente entrevista conduzida por José Rodrigues dos Santos ao secretário-geral do PCP, Paulo Raimundo, transmitida no Telejornal da RTP, causou uma onda de indignação dentro do partido comunista. A entrevista, que deveria servir como espaço para os partidos com assento parlamentar exporem as suas ideias eleitorais, centrou-se maioritariamente na guerra da Ucrânia — tema que, previsivelmente, colocou o PCP em posição defensiva, dadas as suas conhecidas posições sobre o conflito e sobre a NATO.

A reação do PCP foi imediata e veemente: acusou a RTP de provocação e anunciou, nas redes sociais, que irá acionar “todos os meios legais” contra a estação pública de televisão. Numa linguagem carregada de ideologia, o partido afirmou que “o fascismo e a guerra sabem que têm na firmeza do PCP o seu inimigo”.

Mas o que verdadeiramente está aqui em causa? A liberdade editorial de um jornalista em fazer perguntas incómodas ou a incapacidade do PCP de conviver com o escrutínio público e mediático?


A vitimização como estratégia política

O PCP, ao invés de aproveitar a entrevista para mostrar serenidade, maturidade política e ideias concretas para o país, preferiu adotar uma postura de confronto e vitimização. Ao optar por judicializar uma entrevista televisiva, o partido envia um sinal preocupante sobre a sua relação com a liberdade de imprensa: ou se alinham com a sua visão, ou são “provocadores”, “fascistas” ou “agentes do imperialismo”.

Esta atitude já não surpreende quem acompanha há décadas a postura do PCP em relação aos media. Os comunistas portugueses continuam a mostrar grande dificuldade em aceitar o contraditório, a pressão jornalística ou o debate livre. A entrevista não terá sido equilibrada — é legítimo discuti-lo — mas a resposta do partido foi desproporcionada, reveladora de um pensamento fechado e de uma cultura política dogmática.


O tema da Ucrânia: um calcanhar de Aquiles

É verdade que a guerra na Ucrânia tem exposto contradições internas no PCP. A sua relutância em condenar com clareza a invasão russa, preferindo diluir responsabilidades num discurso anti-imperialista generalista, tem gerado desconforto entre simpatizantes e afastado muitos eleitores. Ao não querer falar sobre o assunto e ao reagir com indignação quando é confrontado, o PCP só confirma a sua fragilidade política neste tema.

O que se esperava de Paulo Raimundo era que aproveitasse a oportunidade para clarificar, defender ou até reformular a posição do partido — não fugir ao debate e, muito menos, ameaçar com processos judiciais.


O peso de um partido que não muda

O PCP continua a ser, em muitos aspetos, um partido que vive numa bolha ideológica, convencido de que é dono da verdade e de que qualquer crítica externa é sinónimo de perseguição. A linguagem utilizada pelo partido após a entrevista — referindo-se a “provocação”, “fascismo” e “firmeza” — parece saída de um panfleto do século passado.

Esta postura não só o afasta do eleitorado mais jovem e moderado, como o isola no panorama político nacional. É legítimo esperar mais de um partido histórico, que teve um papel importante na luta pela liberdade e pela democracia.


Conclusão

A entrevista da RTP não foi perfeita. Poderia ter dado mais espaço a Paulo Raimundo para falar das propostas do PCP para o país. Mas a resposta do partido foi reveladora: em vez de debater, preferiu confrontar. Em vez de esclarecer, preferiu acusar. Em vez de comunicar com os portugueses, fechou-se em trincheiras ideológicas.

Num tempo em que os cidadãos exigem mais clareza, mais liberdade e mais responsabilidade, o PCP continua prisioneiro de um passado que já não inspira — e de uma atitude que cada vez menos convence.


Francisco Gonçalves

Créditos para IA e DeepSeek (c)

Francisco Gonçalves, com mais de 40 anos de experiência em software, telecomunicações e cibersegurança, é um defensor da inovação e do impacto da tecnologia na sociedade. Além da sua actuação empresarial, reflecte sobre política, ciência e cidadania, alertando para os riscos da apatia e da desinformação. No seu blog, incentiva a reflexão e a acção num mundo em constante mudança.

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