O Fio da Navalha: A Civilização Ocidental à Beira do Abismo

Durante décadas, acreditámos ingenuamente que a História caminhava numa direção linear de progresso. A queda do Muro de Berlim, o fim da Guerra Fria e a globalização trouxeram a ilusão de que o mundo se tornava mais racional, democrático e pacífico. Mas a realidade de hoje desfaz essa miragem com brutalidade. Estamos a assistir a um perigoso retrocesso civilizacional, marcado por uma nova vaga de autoritarismo global, por uma economia sem freios morais, e pela erosão sistemática dos valores que sustentaram as democracias ocidentais.
O regresso dos predadores
Putin, Xi Jinping, Trump, Erdogan, Orban — nomes diferentes, métodos diversos, mas um mesmo impulso: o poder absoluto. Este novo clube de autocratas não se limita a governar com punho de ferro os seus próprios países. Eles testam as fronteiras da ordem internacional, invadem, destroem, manipulam, infiltram, mentem — e fazem-no com descaramento, diante de um mundo que parece anestesiado.
A Rússia, com a sua guerra criminosa na Ucrânia, não esconde mais o apetite imperial. A China, cada vez mais agressiva em relação a Taiwan e ao Pacífico, quer redesenhar a ordem mundial à sua imagem. E os Estados Unidos, sob Trump, estão a abandonar o seu papel de contrapeso democrático, mergulhados num populismo beligerante que despreza a ciência, a diplomacia e os direitos civis.
A economia do abismo
Enquanto isso, a economia global funciona como um imenso casino. As bolsas valorizam-se com guerras, pandemias e desastres. Os que dominam os algoritmos e a especulação lucram, enquanto os cidadãos comuns enfrentam inflação, precariedade e o esvaziamento das proteções sociais. A riqueza concentra-se de forma obscena em mãos de poucos, enquanto a classe média desaparece e os jovens vivem com menos garantias que os seus avós.
Este modelo neoliberal extremo, que há muito divorciou a economia da ética, criou o caldo de cultura ideal para o florescimento de demagogos: eles vendem ilusões fáceis a populações desesperadas, esvaziam as instituições democráticas por dentro e colocam a liberdade numa corda bamba.
O silêncio da civilização
O mais preocupante, porém, é a passividade crescente. A carta dos direitos humanos, outrora símbolo de esperança, está a ser rasgada na prática. Crimes de guerra, repressão de minorias, perseguição de jornalistas e censura digital tornam-se banais. E a resposta ocidental? Fraca, hesitante, muitas vezes cúmplice.
Os líderes europeus, em especial, parecem perdidos entre o medo de desagradar à opinião pública e a paralisia burocrática. Falam muito e fazem pouco. Quando confrontados com a barbárie, limitam-se a emitir comunicados — enquanto países são destruídos, populações deslocadas, e o extremismo alastra como fogo.
Resistência ou queda
Mas nem tudo está perdido. A História ensina que há sempre uma reação. A resistência, tantas vezes invisível, germina nos que se recusam a aceitar a mediocridade, nos que levantam a voz contra a injustiça, nos que ainda acreditam na força da razão e da dignidade humana.
Cabe-nos, a todos os que nos preocupamos com o futuro, manter viva a chama da lucidez e do espírito crítico. Cabe-nos exigir responsabilidade, reconquistar espaços públicos de debate e ação, e sobretudo, não nos resignarmos ao avanço da barbárie com o silêncio dos conformados.
A civilização não cai de um dia para o outro. Ela apodrece por dentro antes de ruir. Estamos, talvez, nesse ponto de inflexão. Mas enquanto houver quem pense, quem resista, quem escreva, quem lute — ainda não perdemos tudo.
Por : Francisco Gonçalves
Créditos para IA e chatGPT (c)