Democracia e Sociedade

Miguel Albuquerque: Como é Possível Ainda Ser Candidato Pelo PSD?

Num país a braços com sucessivos escândalos políticos, Miguel Albuquerque surge como mais um símbolo da degradação da ética na vida pública portuguesa. Envolvido numa investigação do Ministério Público por suspeitas de corrupção, prevaricação e abuso de poder, o ainda presidente do Governo Regional da Madeira insiste em manter-se em funções e, mais espantoso ainda, continua como candidato do PSD às próximas eleições regionais.

A questão que se impõe é simples: como é possível que, perante tamanha suspeição e indignação pública, Miguel Albuquerque continue a ser legitimado pelo seu partido e aceite como figura de liderança?


1. O Caso: Suspeitas Graves e Arguido ConstituÍdo

Em janeiro de 2024, o país foi surpreendido pela operação levada a cabo pelo Ministério Público, que visava várias figuras públicas e empresários da Madeira. Miguel Albuquerque, presidente regional há quase uma década, foi constituído arguido por suspeitas sérias de crimes que incluem corrupção passiva, prevaricação e atentado contra o Estado de Direito.

Enquanto isso, Pedro Calado, então presidente da Câmara do Funchal, foi detido juntamente com empresários ligados a grandes obras públicas e concessões. A teia de relações entre poder político, autarquias e empresas parece ter atingido proporções sistémicas, com indícios claros de tráfico de influências e favorecimentos em concursos públicos.


2. A Estranha Normalidade da Continuidade

Apesar da gravidade dos indícios, Miguel Albuquerque não foi detido – protegido pela imunidade do seu cargo – e limitou-se a “levantar a imunidade” para se colocar à disposição da justiça, embora ainda não tenha sido ouvido pelo Ministério Público até março de 2025.

O mais espantoso, porém, não é apenas o silêncio da justiça, mas a cumplicidade do PSD nacional. Luís Montenegro, já em queda livre por causa dos seus próprios escândalos, nunca exigiu a retirada de Albuquerque nem promoveu qualquer afastamento profilático. Pelo contrário: o PSD da Madeira continua a alinhar-se atrás do seu líder regional, como se nada tivesse acontecido.

É esta normalização da suspeição que está a matar a confiança dos portugueses na política.


3. O Argumento da “Presunção de Inocência” Que Já Cheira a Mofo

Sempre que um político é apanhado em teias nebulosas, surge o argumento clássico: “presunção de inocência”. E sim, é um pilar do Estado de Direito. No entanto, a questão aqui não é judicial, é política e moral.

Um líder político tem de ser mais do que legal: tem de ser exemplar. Miguel Albuquerque, com o processo pendente, não reúne condições éticas para continuar a representar os madeirenses. O facto de se manter no cargo e insistir na candidatura é um insulto à inteligência e dignidade dos eleitores.


4. O PSD, Refém da Máquina Regional

A teia de clientelismo e poder instalada na Madeira faz com que o PSD nacional tema confrontar Miguel Albuquerque. A estrutura regional do partido é poderosa, enraizada e responsável por votos cruciais. Resultado: prefere-se o silêncio, o recuo e o compromisso com o inaceitável, em nome da sobrevivência política.

Mas esta estratégia pode sair cara. Num momento em que o PSD nacional já está enfraquecido pelos casos que envolvem Luís Montenegro e a empresa Spinumviva, a manutenção de Albuquerque é mais uma bomba-relógio na credibilidade do partido.


5. Um País Sem Consequências

Este caso revela, mais uma vez, um dos maiores males da política portuguesa: a ausência de consequências. Não há vergonha, não há demissões, não há suspensão de candidaturas. Os partidos fecham os olhos, os media seguem o ritmo da espuma diária e os cidadãos entram em mais um ciclo de descrença e abstencionismo.

A democracia não sobrevive sem confiança, e a confiança não se constrói com suspeitos de corrupção a encabeçar listas eleitorais.


Conclusão: A Falência da Ética Política

Miguel Albuquerque deveria ter-se afastado da vida política até ser ilibado. O PSD deveria ter exigido essa clarificação. Mas a sede de poder, o hábito da impunidade e a desvalorização da moral pública fizeram com que tudo continue como se nada fosse.

O problema não é apenas Miguel Albuquerque. O problema é um sistema que permite que Miguel Albuquerque continue.

E esse sistema está a apodrecer por dentro.

Francisco Gonçalves

Créditos para IA, DeepSeek e chatGPT (c)

Francisco Gonçalves, com mais de 40 anos de experiência em software, telecomunicações e cibersegurança, é um defensor da inovação e do impacto da tecnologia na sociedade. Além da sua actuação empresarial, reflecte sobre política, ciência e cidadania, alertando para os riscos da apatia e da desinformação. No seu blog, incentiva a reflexão e a acção num mundo em constante mudança.

Deixe uma resposta

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *