Democracia e Sociedade

Portugal: Preso no Conformismo ou à Espera de um Milagre?

Após 50 anos de democracia, Portugal deveria ser um país próspero, com uma sociedade mais justa, um sistema político transparente e uma economia competitiva. No entanto, a realidade é bem diferente. A corrupção continua enraizada, a pobreza mantém-se persistente e a mentalidade coletiva parece adormecida. O que falhou? Porque é que Portugal continua preso a um ciclo de mediocridade e desilusão?

O Conformismo Português: Um Problema Histórico

Portugal tem uma longa história de resignação. Durante séculos, o povo viveu sob regimes autoritários, sem grande espaço para participação ativa na governação. O sebastianismo, a crença num salvador que um dia viria resolver todos os problemas, tornou-se um símbolo dessa espera eterna por uma solução mágica.

Mesmo após o 25 de Abril de 1974, essa mentalidade não mudou drasticamente. Os portugueses passaram a ter liberdade de expressão e voto, mas muitos continuaram alheios às decisões políticas e económicos do país. Reclama-se muito nos cafés e nas redes sociais, mas pouco se faz para exigir mudanças concretas.

Fracos Governantes Fazem Fraca a Forte Gente

A classe política portuguesa tem sido, na sua maioria, um reflexo da passividade do povo. A corrupção e o compadrio tornaram-se parte do sistema, e a incompetência muitas vezes é recompensada em vez de ser penalizada. Os partidos políticos alternam no poder sem grandes diferenças ideológicas ou estruturais, e as reformas necessárias são constantemente adiadas ou feitas de forma superficial.

O pior é que a sociedade aceita isso como normal. A frase “são todos iguais” tornou-se uma desculpa para a inação, e os poucos que tentam mudar o sistema são rapidamente esmagados por uma máquina burocrática e corrupta que não quer perder os seus privilégios.

O Desinteresse pelo Conhecimento e a Cultura do “Desenrascanço”

Outro problema grave é a falta de cultura de estudo e excelência. Muitos portugueses valorizam o “desenrascanço” – a capacidade de encontrar soluções rápidas e improvisadas – mas desprezam o esforço contínuo de aprendizagem e melhoria.

O ensino, em vez de incentivar o pensamento crítico, muitas vezes forma cidadãos que decoram para os exames mas não questionam o mundo à sua volta. A valorização do futebol e dos “desportos de bancada” supera em muito o interesse por ciência, tecnologia ou inovação. Quem se esforça para ser melhor é frequentemente visto como “convencido” ou “elitista”, enquanto os “espertos”, que sabem contornar o sistema, são admirados.

O Papel da Sociedade: O Povo Está Adormecido?

Portugal poderia mudar se houvesse um movimento de cidadania ativa, se as pessoas se unissem para exigir mais dos seus governantes e participassem na construção de um país melhor. No entanto, a maioria prefere esperar que alguém faça isso por eles.

A Islândia, por exemplo, conseguiu reformar o seu sistema político após a crise de 2008 porque o povo saiu à rua e não aceitou voltar ao mesmo. Mas em Portugal, mesmo quando há escândalos políticos e económicos, a indignação dura pouco tempo e nada muda.

Há Esperança? O Que Poderia Ser Feito?

Para que Portugal saia deste ciclo, seriam necessárias mudanças profundas:

  1. Reforma Política – Fim da impunidade para corruptos, mais transparência e limitação de mandatos.
  2. Educação de Qualidade – Um ensino que fomente o pensamento crítico e prepare as novas gerações para inovação e excelência.
  3. Mudança de Mentalidade – O povo precisa de deixar de aceitar a mediocridade e exigir mais dos seus governantes.
  4. Economia Baseada no Conhecimento – Em vez de depender do turismo e de serviços de baixo valor, Portugal deveria apostar em tecnologia, ciência e indústria de ponta.
  5. Participação Cívica – Os cidadãos devem envolver-se mais na política, não apenas votando, mas fiscalizando e exigindo responsabilidade dos líderes.

No entanto, todas essas mudanças exigem algo que tem sido raro na história recente do país: uma vontade coletiva real de mudança. Será que ainda há espaço para essa transformação, ou Portugal está condenado a repetir o seu ciclo de conformismo?

A resposta está no povo. Mas até agora, tudo indica que a maioria continua à espera de um D. Sebastião que nunca chegará.

Francisco Gonçalves

imagem gerada pelo ChatGPT (c)

Francisco Gonçalves, com mais de 40 anos de experiência em software, telecomunicações e cibersegurança, é um defensor da inovação e do impacto da tecnologia na sociedade. Além da sua actuação empresarial, reflecte sobre política, ciência e cidadania, alertando para os riscos da apatia e da desinformação. No seu blog, incentiva a reflexão e a acção num mundo em constante mudança.

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